Se o Brasil nunca foi um país lá muito próspero de heróis, que tal se pensarmos numa reinvenção, que desse jeito sim tivesse feito sucesso? Trata-se de versões criativas dos heróis japoneses antigos com direito a toda liberdade, já que o pessoal da Toei Company, estúdio responsável pela produção dos tokusatsus e super sentais, estava bem longe, provavelmente sem conhecimento dos nossos quadrinhos publicados pela Abril Jovem. Segunda iniciativa de levar os heróis de nossa infância aos quadrinhos, a primeira foi lá pelos idos de 1989 em um gibi da editora Ebal que publicava versões adaptadas dos episódios das séries, mesmo com uma ou outra alteração e alguns cortes, mas quem era moleque na época se amarrava e não perdia um número sequer, e na onda dos gibis vieram revistinhas de passatempo, álbum de figurinhas e revista pôster que durou até a febre passar. Um tempo depois pinta nas bancas uma novidade que me encantou de primeira, uma edição em formatinho que trazia o Jaspion na capa lançada pela editora Abril Jovem. Era um Jaspion reinventado, com personagens novos e vilões bizarros, meio americanizado, em sua forma cívil o herói era meio mauricinho, menos bonachão como era na TV e o gibi contava com histórias depois da derrota do Império Satan Ghost, nada de pássaro dourado, professor Nambara e seus filhos Kenta e Kanoko, nada do Edin velhinho, nada de Miya, a Anri era a maior gata e não dava aqueles curto-circuitos e tics defeituosos que ela tinha no seriado. Além da história do Japion o gibi também tinha uma dos Flashman, o desenho era fiel e o que eu mais achava maneiro, as historias eram inéditas. Nem preciso dizer que comprava os números seguintes, mas como eu era bem moleque dependia da minha mãe me dar dinheiro, e dependendo, se fosse bonzinho e me comportasse, ganhava revistinha, e claro que eu escolhia quase sempre as da Hero Club, alcunha adotada pelos gibis do Jaspion como uma sub-editora. Dependendo da edição também vinha história dos Changeman, Flashman, Maskman e Boomerman (aquele cara do bumerangue amigo do Jaspion hehe, acho que os produtores do seriado nunca imaginaram tanto destaque para ele), os personagens eram mais bombados que nos seriados e era comum um participar da aventura do outro em interessantes crossovers, criando-se assim um universo novo, o universo dos heróis japoneses tal qual um universo Marvel ou DC, por exemplo, e o que é melhor, criado por brasileiros, ressuscitando os antigos heróis da TV Manchete já que fazia uns aninhos que a moda passou e a criançada já estava saturada de reprises. É de encher de orgulho, né não? Só que o roteiro, a maior parte deles feita por Marcelo Cassaro e Rodrigo de Goés, inovava tanto que o herói ficava praticamente irreconhecível. Usava os habituais armamentos e equipamentos do seriado, até mesmo Daileon marcava presença, só que o desenho do robô gigante era rústico demais e em pouco lembrava o do seriado. Tinha feições grotescas e ficava em poses humanizadas, e o mais engraçado, conforme o desenhista ia mudando ia ficando cada vez mais feio, mais simples, a ponto do leitor achar que o desenhista tinha dificuldade e preguiça de desenhar o robô. O uniforme espacial do herói e da sua companheira Anri estilo Star Trek foi uma boa elaboração. Embora os desenhos não fossem ruins, Jaspion era outro personagem que sofria modificação ao passar por diferentes desenhistas, o herói já foi moreno, loiro, ruivo, já teve cabelo cacheado e já foi cabeludo, só faltou mesmo aparecer um Jaspion negro, mas, se um Peter Parker, por exemplo, também já sofreu transformações nas mãos de grandes desenhistas como John Romita, Steve Ditko e Gil Kane, é natural que cada autor desse seu toque ao personagem. Hoje seria provável que o herói ganhasse traços mangá. Um vilão inventado especialmente para as histórias do gibi que até hoje não me sai da cabeça é Nimbus, uma espécie de guerreiro imperador musculoso e robusto, de armadura espinhosa e cabelo moicano. Como o público alvo dos heróis dos tokusatsus são em sua maioria infantil, o roteiro também não era lá essas coisas, hoje relendo a gente percebe isso, mas a iniciativa teve seu saldo positivo. A Abril Jovem será lembrada como a maior editora que lançou gibis importantes de heróis nos anos 90, e com isso a Hero Club colaborou também, tendo mais títulos vendidos que uma Panini Comics.
Um tempo depois chegou o gibi dos Cybercop também pela Hero Club, dessa vez um pouco mais fiel ao seriado. Depois foi a vez de Black Kamen Raider e Spielvan, esses dois eu gostava menos, mas comprava mesmo assim. Dessa maneira, a publicação das revistas da Hero Club passou a ter o título de Heróis da TV. O que passei a comprar religiosamente foi o gibi dos Mask Man, nova investida da Hero Club, já que o gibi do Jaspion já não estava mais sendo lançado. Mesmo não sendo a primeira vez que os Mask Man apareciam nesse novo universo dos gibis de heróis, as aventuras dos Defensores da Luz, último sentai decente que emplacou por aqui eram muito divertidas, e o ápice foi um confronto entre duas equipes queridas dos super sentais, Maskman versus Changeman. A história, que durou o gibi inteiro, apesar de ter sido bacana teve o final estragado. Isso porque ao que parecia os roteiristas não levavam muito a sério os heróis japoneses e fizeram uma gaiatisse digna dos gibis da Turma da Mônica; os heróis liam os gibis dos outros heróis da casa (!) e numa tentativa de botar uma equipe contra a outra, um vilão se deu mal ao seguir literalmente um erro de roteiro de uma das edições passadas. Outra coisa que me incomodou foi mais um desrespeito dos roteiristas que achavam que os leitores eram crianças babacas, será que sou o único a ficar incomodado com isso? Numa aventura maneiríssima na qual Jaspion foi pego numa armadilha e os Changeman ficaram sem saber como resolver a situação, a conclusão foi deixada para o número seguinte, e fiquei na maior expectativa quando comprei a próxima revista. Imaginam para quem os Changeman foram pedir ajuda? Para o roteirista e o desenhista, já que eram os únicos que poderiam ajudá-los. Parei.
Chegou a ser lançado o Almanaque Abril Jovem que publicava histórias de cada grupo e herói e o almanaque Spielvan. Ah, já ia me esquecendo dos Change Kids, gibi para crianças de versão infantil dos personagens dos Changeman, e como eu também era criança na época, adorava ler. Não que precisasse escrever isso aqui, mas nas histórias dos Changemanzinhos não tinha soldados Hiddlers, no lugar do Sargento Ibúki tinha um velhinho chamado dr Lokito e o Change Robô tinha comportamento humanizado.
Em 1994, época que os gibis Heróis da TV já estavam ficando saturados, um Almanaque Spielvan veio com uma novidade, Spielvan (Conhecido des de sempre como Jaspion 2) versus Jaspion. Não vi na época, só li agora graças a esse site
http://gibitokusbrasil.blogspot.com que publica gibis escaneados dos nossos queridos heróis japoneses antigos, já tinha falado desse blog, mas não posso deixar de comentar de novo, a iniciativa do autor, Luilson Marcelino, é de tirar o chapéu. Voltando à história do Spielvan versus Jaspion, o roteiro é fraco e os desenhos bem ruinzinhos, mas talvez se eu lesse na época fosse achar um pouquinho melhor. Se bem que nessa época mesmo eu já estava deixando de ler os gibis dos Heróis da TV. Foi bom enquanto durou. Teve uma boa aceitação de público e boas vendas, mesmo que na primeira metade dos anos noventa a Abril Jovem lançasse promoções para alavancar vendas de gibis do tipo dois gibis por preço de um, alguns até de outros títulos como As Aventuras dos Trapalhões, Menino Maluquinho, Pica Pau, Tom e Jerry e alguns da Disney, e lançar junto com algumas publicações álbuns de figurinhas e brindes como bonequinhos e joguinhos de Mini Batalha Naval. Muito além do assunto desse
post, os quadrinhos nacionais merecem ser valorizados e não podemos nos esquecer da importância que quadrinistas como Watson Portela, João Pacheco, Arthur Garcia e Roberto Martin tiveram ao meio. Por onde andam?
E não para por aí
Chegou a ver nas bancas no ano de 1995 uma edição da revista Dragão com uns heróis japoneses desenhado de sacanagem na capa com o título Defensores de Tóquio? Trata-se de um RPG inteiramente nacional cujo tema é uma paródia (ah, esculhambação mesmo) sobre os super heróis japoneses. Na época Os Cavaleiros do Zodíaco estavam estourando e é claro que não foram poupados. Também fazia parte um herói brasileiro criado para as revistas de videogame da Escala, Capitão Ninja. Quanto aos editores, adivinha quem eram? Os mesmos de Heróis da TV, e não poupavam zoação aos nossos heróis, usando frases como ´´imitação japonesa do Robocop / herói mutante com cara de gafanhoto / reprises até a fita arrebentar...`` quem é bem humorado até tem umas risadas arrancadas, mas nem todos pensam assim. Se fosse hoje, neguinho matava.