De fato o aracnídeo da Marvel já teve filmes bem melhores que os do Marc Webb. E não falo apenas da trilogia de Sam Raimi, como também do primeiro live action que nem do meu tempo é. Me refiro ao Homem Aranha - O Filme, de 1977, dirigido por E. W. Swackhamer e com Nichollas Hammond (A Noviça Rebelde) como Peter Parker, que inclusive chegou a ser exibido nos cinemas brasileiros, sendo originalmente o episódio piloto do que viria a ser um seriado cancelado já em sua segunda temporada. Deixando de lado os nauseantes episódios arrastados do que se tornou um enfadonho seriado, nos concentremos no primeiro longa, que isso sim é coisa boa. Apesar de produzido com baixo orçamento, efeitos especiais datados e usados com precariedade, consegue ser fiel ao aracnídeo e sua mitologia, assisti-lo nos dias de hoje nos faz esquecer um pouco o trauma sofrido pelas duas últimas produções do herói. Hammond faz a respeitável caracterização do personagem que esperaríamos e embora falte ingredientes importantes para o processo de criação do herói, como o tio Ben, por exemplo, que sequer é citado, ao menos os elementos que fizeram uma falta danada nos filmes de Marc Webb estão ali presentes, como J. J. Jameson e Robbie Robertson, que com Peter rendem diálogos realmente engraçados assim como nas outras mídias, uma tia May idosa que teve participação suficiente embora tenha aparecido poucas vezes, e apesar de alguns personagens não serem citados podemos notar sua presença com nomes diferentes, ou mesmo tendo seus papéis supridos pelas participações de personagens semelhantes, como é o caso do Capitão Barbera (igualzinho o Capitão Stacy) e Judy, interesse amoroso de Peter, que não deve nada em atributos e qualidade para a Gwen ou Mary Jane. Já o Harry pode ser ´´interpretado`` pelo jovem que acompanha Peter durante a experiência no laboratório da faculdade com a aranha radioativa que lhe pica conferindo-lhe super poderes, aparecendo usando uma camisa com o sugestivo símbolo de uma estrela no peito, e a secretária Betty Brant do Clarim Diário supostamente aparece no filme seguinte, teoricamente o primeiro episódio do seriado, atendendo pelo nome de Rita Conway. Seria isso problema de direitos autorais, de tradução ou descaso mesmo? A origem do Aranha é a mesma que nos quadrinhos, porém nessa película há uma ou outra coisa que não contávamos, mas nada que nos faça perder a esportiva. Peter já tirava fotos para o Clarim desde o início do filme, antes até de adquirir seus poderes aracnídeos, e seu principal motivador para se tornar um combatente do crime foi simplesmente o desejo de dar uma identidade para o homem outrora visto pendurado num prédio da cidade para vender suas fotos, mesmo que antes já viesse esboçando um senso de justiça. Isso depois de acharmos que só o fato de não lembrarem do tio Ben ser uma deslize imperdoável, mas essas são as únicas discrepâncias que a gente acaba perdoando considerando ser essa a primeira tentativa de criar uma história do super herói dos quadrinhos com pessoas reais.
Como era de se imaginar, nada de super vilões como o Duende Verde. Aliás, nenhum vilão conhecido dá as caras em toda carreira do Aranha setentista. Se forçarmos um pouco tentando imaginar como seria a vestimenta, maquiagem e o planador nessa que seria a primeira adaptação, até que preferimos como ficou. O antagonismo então ficou por conta de um mestre em hipnose que, através de ondas telepáticas disseminadas por uma bizarra geringonça que ´´zumbifica`` as pessoas, aterroriza Nova York fazendo a população cometer suicídio pouco a pouco. As cenas de luta ficam por conta de três japoneses armados com bambu que aparecem em intervalos pontuados, sendo que na última vez, livres do domínio hipnótico, tornam-se simpáticos sorridentes e até tiram foto ao lado do herói aracnídeo. Para a época não podíamos esperar muito em matéria de ação, é clara a falta de técnica, os errinhos aqui e ali, mas foi engraçada e curiosa a acrobacia que o herói fazia para tentar honrar o nome do cabeça de teia dos gibis, lembrando que o filme tinha baixíssimo orçamento até para contratar experts na modalidade. É interessante ver que não raras eram as vezes em que o herói se dava mal em combate, mesmo sendo os mesmos três pés de chinelo que tudo que faziam para incrementar o combate era utilizar um lança chamas. Mas valeu a boa vontade. Quanto ao uniforme, apesar de bem pobre, contêm uns detalhes curiosos que podia até ser bem pensando nos gibis, o Aranha usa um cinto onde guarda seus cartuchos de teia (na verdade ele o adota em sua segunda aventura, mas tá valendo a ´´novidade``), mas seu lançador de teia é bem feio, fica por fora do uniforme e é tão volumoso quanto um relógio. E para completar ele usa apenas UM lançador, cujo acionador é basicamente uma colher, mas ele sequer precisa apertar para lançar a teia, bastando para isso apenas abrir a mão, o famoso sinal de ´´chifre`` não é usado, quem sabe o diretor é um religioso radical. Mas ganha alguns pontos no quesito realismo, o lançador não ficaria encaixado tão uniformemente no braço de jeito nenhum, o filme ´´prova`` que é fisicamente impossível. Quanto às teias, o herói por razões óbvias não as lança tão costumeiramente como em outras versões, sua habilidade mais destacada é a de escalar paredes, mesmo sobre um chroma mal caprichado. O pessoal da época não teve escolha senão imaginar que aquela espécie de algodão doce em seu processo de fabricação, a cordinha da cena em que é lançada de um prédio a outro usada mais de uma vez e as redes de vôlei usadas para capturar os inimigos é a genuína teia resistente e pegajosa desenvolvida por Parker. Outro detalhe gritante que não consegue passar esquecido é o sensor de aranha que só se manifesta quando o herói está em seu estado civil. Seus olhos ficam vermelhos, adota momentaneamente uma aparência zumbi e o que é mais incrível, consegue antever toda ação de perigo. Seu sensor de aranha jamais voltaria a ser tão, digamos, aprumado. No geral, é um bom filme, o comparo com o seriado Batman e Robin dos anos 60. E no caso do cabeça de teia, o filme é mais digno de respeito que qualquer um estrelado por Andrew Garfiel, você não acha?